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Artigo de Rafael Birmann: Por uma ética urbana

22/06/15


Rafael3Somos, cada vez mais, um mundo de cidades e o futuro da humanidade é urbano. Este é o raciocínio do presidente do Conselho de Administração da UPSA, Rafael Birmann. De acordo com ele, devemos encadear os pensamentos no contexto urbano e buscar a preservação do espaço público. Confira a íntegra de seu artigo publicado nesta segunda-feira (22/6) no jornal Correio Braziliense:

Como uma reação às cidades distópicas da Revolução Industrial, no século XIX, embarcamos nas visões anti-urbanas e automobilísticas, da utopia modernista. Hoje, porém, revalorizamos as cidades, as ruas, a densidade. O inchaço urbano multiplica os desafios e o foco atual é como fazer as cidades mais humanas neste futuro urbano.

Mas quem faz as cidades? O “Governo” constrói a infraestrutura e os prédios públicos, faz e aplica as leis que regulam as cidades; a “Academia”, aí incluídos arquitetos, engenheiros, consultores, e outros, propõe soluções e desenha a cidade. Já a “Sociedade Organizada”, cada vez mais, pressiona, exige, briga, e questiona o que se faz; Os construtores, incorporadores e afins, são aqueles que investem, vendem e constroem, e, disputam a primazia na culpa pelas mazelas da cidade.

Na verdade, somos todos responsáveis. Acusar os “Construtores”, de especuladores, que não atendem às necessidades da habitação, obcecados por lucro, é demagógico. Cadê os outros? O “Governo” tentando tutelar a todos, faz demais sem fazer o suficiente; a “Academia” não encontra, em suas utopias, a saída para realidade e a “Sociedade Organizada” muitas vezes, exige no seu quintal o que não assume pela cidade. A Falta de habitação, trânsito infernal, insegurança, etc…. São problemas complexos que não merecem, por cima de tudo, ser vítimas da guerra entre “nós” e “eles”.

O mercado imobiliário investe por resultados, busca seu interesse próprio, aliás, como qualquer pessoa. O interesse próprio é da essência do instinto de sobrevivência. O lucro e a propriedade privada são grandes motivadores, mas, os homens são multidimensionais, têm outras ambições, outros interesses. Querer uma cidade melhor, também é interesse próprio.

Acatamos a função social da propriedade, obedecemos às leis de uso do solo, as leis ambientais e todo emaranhado legal e normativo que rege, até as minúcias, a construção. O estado de direito é um pré-requisito básico para realização de qualquer negócio, imobiliário ou não, mas a ânsia regulatória da burocracia hipertrofiada sufoca muitas soluções.

No entanto, apesar da regulamentação excessiva e contraproducente, mais uma, talvez, seja necessária – uma auto-regulamentação, os “dez mandamentos”, um “juramento de Hipócrates”, enfim uma ética urbana, regrando o comportamento dos agentes do mercado imobiliário. Na ética judaico-cristã, a regra de ouro é “Não faça aos outros o que não quer que seja feito a você”. O princípio da ética urbana poderia ser “Não faça uma cidade onde você não gostaria de viver”.

Quais seriam estas regras? Uma seria olhar além das divisas do terreno, pensar no contexto urbano. Outra? Preservar o espaço público. Nem todo terreno pede um projeto imobiliário, nem todo negócio é bom para cidade, que tem outras dimensões a preservar – a paisagem, a cultura, a história, os espaços públicos. Precisamos explicitar estas regras da Ética Urbana.

Mas não será um mero “construtorzinho de apartamentos” que resolverá os gigantes problemas da cidade. Isso é dever de todos e não pode recair sobre os ombros de um particular. Para avançar nessa discussão, precisamos todos rever posições. Para os “construtores”, a proposta é que se defina, em termos claros, qual é o seu compromisso com “uma cidade melhor”.

Num cenário de litígios crescentes, insegurança jurídica e aumento do envolvimento da sociedade na aprovação dos projetos (inclusive na fase pós-aprovado), é premente o dialogo transparente e acima dos preconceitos. A discussão sobre o futuro das cidades não pode prescindir do governo, da academia ou da sociedade organizada. Óbvio.

Mas também não pode prescindir dos “construtores”, do “mercado”, por todo seu envolvimento direto nas transformações da cidade, por seu foco na realidade concreta. Mas para que o setor tenha credibilidade na defesa de seus pontos de vista, para que consiga se fazer ouvir nesta discussão, é preciso falar sobre muito mais do que apenas da realidade. Precisamos falar, e em voz alta, dos valores que defendemos e o que almejamos para nossa cidade.

Uma Ética Urbana vai nos ajudar a defender a cidade que desejamos, a estabelecer critérios objetivos para sermos julgados e a nos credenciar como interlocutores da discussão sobre o futuro das cidades.

Fonte: Correio Braziliense

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