03/04/13
Entre julho de 2012 e março deste ano, cerca de 42 pessoas foram presas por grilagem. Os dados são da Secretaria da Ordem Pública e Social (Seops). Operações conjuntas do GDF e da polícia conseguiram frustrar negócios que renderiam R$ 80 milhões.
Confira a matéria publicada no Correio Braziliense:
Fraude de R$ 80 milhões
A grilagem de terras ainda é um crime que desafia as autoridades brasilienses, mais de duas décadas após o início do parcelamento irregular do solo no Distrito Federal. Em nove meses, operações conjuntas do governo e da polícia conseguiram frustrar negócios que renderiam R$ 80 milhões aos criminosos. Até hoje, a procura por imóveis ilegais é grande, mesmo depois da criação de mais de 500 condomínios fora da lei, onde cerca de 600 mil pessoas vivem sem escrituras dos lotes e com infraestrutura precária. Ontem, um grileiro foi preso tentando vender imóveis no condomínio Bouganville, em Sobradinho, a três quilômetros da Torre de TV Digital.
De acordo com levantamento da Secretaria da Ordem Pública e Social (Seops), feito exclusivamente para o Correio, 42 pessoas foram presas em pelo menos 13 regiões administrativas do DF, entre julho de 2012 e o fim de março deste ano (veja quadro). Documentos apreendidos com os grileiros apontam que 1.419 lotes ilegais seriam vendidos. Cada terreno irregular custa, atualmente no DF, R$ 56.377, valor bem abaixo do mercado imobiliário formal. Mas o preço dos lotes varia de acordo com o perfil socioeconômico da região. Em locais mais pobres, como o Morro da Cruz, em São Sebastião, cada unidade de 200m² era comercializada por R$ 20 mil. Já no Jardim Botânico, o valor do terreno chegava a R$ 135 mil.
O suspeito preso ontem, Eduardo Lima Oliveira, 36 anos, tentava comercializar seis lotes de 600 m² por R$ 70 mil cada. Ele se passava por corretor de imóveis, mas não tinha registro no conselho regional (Creci). O homem foi flagrado por agentes da Seops e da Delegacia Especial do Meio Ambiente (Dema) negociando um terreno com um casal. Com Eduardo, os agentes apreenderam documentos, como cessões de direito de uso e notas promissórias, que comprovam a grilagem. O homem foi preso por parcelamento irregular do solo, crime com pena que pode chegar a cinco anos de prisão e multa de até 100 salários mínimos.
Não é de hoje que a região onde foi erguida a Torre de TV Digital é alvo de invasões (veja Memória). Vizinho ao monumento, estão alguns grandes parcelamentos, como o Império dos Nobres e o Condomínio RK. O ponto turístico está em uma região valorizada, ao lado de extensos espaços vazios, com localização cobiçada por serem perto do Plano Piloto e terem vista nobre do Lago Paranoá. É a segunda vez que a Seops e a Dema prendem grileiros no condomínio Bouganville. Em julho de 2007, quatro pessoas foram detidas na tentativa de vender 330 terrenos de 600 m², em um negócio que renderia R$ 20 milhões.
Liminar
O Bouganville é um empreendimento de luxo, que já tem guarita e casas erguidas. Apesar disso, não está em processo de regularização, e o governo tenta derrubar as construções feitas irregularmente. O problema é que, dois dias depois da prisão dos grileiros, em julho do ano passado, advogados dos moradores conseguiram uma liminar que impede a entrada do GDF no local. A Procuradoria-Geral do DF contesta a decisão. “O trabalho do governo é regularizar os condomínios existentes e impedir o surgimento de novos. Os que já existem também não podem mais crescer”, afirma o major Carlos Chagas de Alencar, subsecretário de Operações da Seops. “Desde o flagrante do ano passado, monitoramos essa área do Bouganville, até descobrir que esse grileiro estaria aqui hoje (ontem)”, acrescenta.
Segundo o major, os criminosos se aproveitam do alto valor dos imóveis regulares no DF para convencer os compradores das terras ilegais. “O cara vende um lote de 800m² por R$ 70 mil, enquanto um lote regular no Paranoá, de 300m², custa mais de R$ 150 mil”, exemplifica.
Memória
Área cobiçada
Antes mesmo da inauguração da Torre de TV Digital, a área perto do monumento era cobiçada por grileiros. A meses da abertura à visitação, o Correio mostrou que o Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) queria fazer uma legislação para incluir a obra e as áreas vizinhas no rol de bens tombados do DF. A intenção era manter uma área vazia, com tamanho entre 1 e 3 hectares, ao redor da Torre de TV Digital. O projeto, no entanto, dependia de autorização do GDF, e a iniciativa não prosperou.
Não há lotes particulares próximo à torre, apenas terras públicas, a maioria de propriedade da Terracap. A Torre de TV Digital está dentro do loteamento Taquari 1, Trecho 2. Além do terreno onde foi construído o monumento, há mais de mil lotes públicos registrados em cartório. Esses imóveis poderão ser vendidos no futuro, em licitações públicas organizadas pela companhia.
O tamanho da cobiça nos arredores da Torre Digital pode ser medido pela valorização do metro quadrado das edificações construídas no local. Estimativa da Associação de Empresas do Mercado Imobiliário do Distrito Federal (Ademi-DF) revela que o preço do metro quadrado residencial na região aumentou até quatro vezes nos últimos três anos. Saiu de R$ 1 mil, em 2009, para R$ 4 mil atualmente. A lógica do mercado é simples: quanto mais próximo ao monumento de Oscar Niemeyer, mais caro o valor do terreno ou do imóvel.
Denuncie
197 – Polícia Civil
156 – Ouvidoria do GDF
190 – Polícia Militar
3362-5899 – Dema
As denúncias podem ser anônimas
Principais operações
27 de março de 2013
Ponte Alta Norte – Gama
Dois presos
Lucro total: R$ 450 mil
Área total: 2 hectares
Denúncia de um morador
21 de março
Incra 9, região do Núcleo Rural Alexandre Gusmão
Dois presos
Lucro total: R$ 3,6 milhões
Área total: 9 hectares
O terreno abrigaria dois condomínios — Agape 1 e 2, com 60 e 20 lotes, respectivamente. Lotes de 840m², cada um vendido entre R$ 30 mil e R$ 60 mil
20 de fevereiro
Chácara Nossa Terra, Itapoã
Um preso
Lucro com a venda: R$ 800 mil
Área total: 2 hectares — 32 lotes de 300m² cada
Futuro condomínio Cravo e Canela
Cada lote ofertado por R$ 25 mil
25 de janeiro
Núcleo Rural 26 de setembro, Taguatinga
Dois presos
Área da Terracap – Floresta Nacional de Brasília (Flona)
Lucro total: R$ 10 milhões
Área total: 24 hectares
Terreno seria parcelado em 235 lotes (comerciais e residenciais)
Valores entre R$ 38 mil e R$ 42 mil
Denúncia anônima Ouvidoria do GDF
6 de dezembro de 2012
Núcleo Rural Vargem da Benção, Recanto das Emas
Dois presos
Lucro total: R$ 1,2 milhão
Área total: 4 hectares
56 lotes de 300m²
Cada um vendido por R$ 22 mil
29 de novembro
Avenida do Sol, Mansões Serranas, Jardim Botânico
Dois presos
Lucro total: R$ 2 milhões
15 lotes de 700m²
Cada um por R$ 135 mil
11 de outubro
Altiplano Leste, Lago Sul, em frente ao condomínio Mini Chácaras
Três presos
Área total: 3,6 hectares
350 lotes de 500m²
Suspeita de uso de herbicida (veneno para plantas) para a abertura de ruas sem chamar a atenção
A polícia não conseguiu apurar por quanto os terrenos seriam vendidos
8 de outubro
DF-290, em Santa Maria, ao lado do balão do Novo Gama
Dois presos
Lucro total: R$ 32 milhões
116 lotes de tamanhos entre 250m²
e 519m²
26 de julho
Núcleo Rural Bolqueirão, Paranoá
Um preso
Lucro total: R$ 6 milhões
Área total equivalente a 43 campos de futebol
60 lotes de 20 mil m², vendidos
a R$ 100 mil cada
24 de julho
Condomínio Bouganville, próximo à Torre de TV Digital, em Sobradinho
Quatro presos
Lucro total: R$ 20 milhões
Área equivalente a
10 campos de futebol
336 lotes de 400 a 800m²
Cada um vendido por R$ 60 mil
(Correio Braziliense / Gizella Rodrigues)